segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Cidadania à Brasileira

Hoje, 4 de outubro de 2010, um dia após as eleições, nas rádios, fala-se apenas delas. Análises, previsões, críticas, entrevistas, enfim, tudo é eleição. Não podia ser diferente dada a importância, cada vez mais consciente na cabeça dos brasileiros, que ela tem na nossa vida cotidiana. É verdade que o processo eleitoral brasileiro, apesar de toda a informatização, contém o que em estatística se chama "viés significativo", especialmente na escolha dos candidatos a cargo legislativo, em regime proporcional, mas isso são outros quinhentos.
O que quero falar é de uma cena revoltante que assisti vindo para o trabalho, no viaduto sobre a Av. Paulo de Frontin, Rio de Janeiro. Um pega entre dois ônibus da empresa Real, de números de registor 41069 e 41073. Era evidente que um queria ultrapassar o outro, e para isso executavam manobras que já seriam consideradas perigosas para um veículo de passeio: cortes, costuras, ultrapassagem pela direita etc.
Atrás dos veículos, novinhos em folha, um cartaz simpático pergunta: Como estou dirigindo? Ligue para 0800-886-1000. Assumo que falar pelo celular é um delito menos perigoso que o quê estava assistindo, tento ligar. Voz gravada avisa: "ligações desse aparelho não estão autorizadas".
Entro em meu escritório e pego o aparelho de telefone fixo. A voz gravada sugere que "em caso de reclamação ou sugestões, pressione 3". Uma atendente simpática pede meu nome (mas não diz o seu), avisa que o protocolo é oitenta e tanto e pergunta no que ela pode ajudar. Digo que quero denunciar um "pega" entre dois ônibus da empresa Real no viaduto sobre a Av. Paulo de Frontin. Ela responde que, para isso, eu devo fornecer dados para um cadastro completo, já que era a primeira vez que entrava em contato com a "Central de Atendimento ao Consumidor das Empresas de Ônibus Municipais do Rio de Janeiro", ou coisa parecida. Trata-se pois, nada mais, nada menos, que o sindicato patronal dos ônibus do Rio de Janeiro (aquele que apoiou com "tudo" que podia apoiar, nosso atual e re-eleito governador Sergio Cabral). Cadastro completo, significa dar RG, CPF, endereço residencial, de trabalho, enfim, toda a informação necessária para todo tido de pressão e constrangimento. Pergunto à paciente atendente, qual é a relevância do CPF e RG de alguém que assiste e denuncia um delito grave de trânsito de duas unidades de uma empresa que eles representavam. Ela responde que isso é imposição do decreto seis mil e não sei quanto. Pergunto a ela: "decreto de quem". Sem saber responder ela diz isso é norma do SAC. Pergunto a ela, que garantia ela me dá que os meus dados não vão parar na mão de quem deveria ser punido com a denúncia. Ela me responde que só uma pessoa teria acesso a essa informação. Pergunto, então, se ela poderia me fornecer os dados completos dessa pessoa, para eu poder me defender, se acaso submetido a constrangimento.
Fim do papo: se Sr. quer se manter anônimo, lique para o "Disque Denúncia". Ligar para o "Disque Denúncia" que vão receber meu depoimento em meio a denúncias de de tráfico, assassinatos e outros desmando que acontecem a três por dois no Rio.
Essa é a "cidadania à brasileira".